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Entrevista: Roberto Guedes
Por Marcio Baraldi
04/04/2008

Lustrando a Era de Bronze dos Super-Heróis

Roberto Guedes e algumas das publicações que escreveu ou editou
(clique na imagem para vê-la ampliada)

Roberto Guedes, o famoso Guedão, é aquilo que se chama por aí comumente de “Enciclopédia dos Quadrinhos Ambulante”. O cara é um dos maiores experts do assunto no Brasil, e se o capítulo enfocado então for Super-Heróis da Silver Age (Era de Prata, 1958-1969) e Bronze Age (Era de Bronze, 1970-1985), aí o cara reina sossegado! Prova disso é que ele foi o primeiro brasileiro a lançar um livro sobre os heróis da Silver Age (e de quebra da Golden também),o Quando surgem os Super-Heróis, pela editora Opera Graphica. No ano seguinte repetiu o super-feito e lançou A Saga dos Super-Heróis Brasileiros, o primeiro livro sobre Super-Heróis nacionais.E agora o inquieto Guedão acaba de lançar o terceiro volume de sua trilogia: A Era de Bronze dos Super-Heróis pela editora HQM, o volume mais ousado dos três, afinal trata-se do PRIMEIRÍSSIMO livro sobre o assunto no mundo! É isso mesmo, pode vasculhar nos confins da Internet que você não vai encontrar até o momento nenhum outro livro no mundo EXCLUSIVAMENTE sobre a Bronze Age! Coube a um brasileiro o pioneirismo de tal empreitada! Mais um tapa na boca daqueles maus brasileiros que adoram duvidar da competência, inteligência e talento nacionais. Fortemente influenciado por seus mestres Stan Lee, Roy Thomas e Marv Wolfman, o supra-sumo dos roteiristas da Marvel Comics, Guedão ainda cria seus próprios personagens, como o adolescente Meteoro e o super-grupo Os Protetores. Como se não bastasse, Guedes ainda é tradutor e editor dos maravilhosos Masterworks da Marvel, lançados no Brasil pela Panini. Enfim, um caboclo que respira super-seres 24 horas por dia como este merecia também uma super-entrevista para falar à vontade. E aqui está ela, ou melhor, parte dela, já que o próprio Guedes a considerou originalmente muito longa e pediu para cortar boa parte das bobagens e piadas que fizemos, concentrando a atenção no livro e nos assuntos mais sérios. Então, ladies and gentlemen, acomodem-se em suas poltronas preferidas que o Dr.Guedes, o Stan Lee brasileiro, abriu o baú de tesouros das HQs, tirou o bronze e vai lustrá-lo com brilho máximo bem na nossa frente. Como dizia o poeta: ”Gente é pra brilhar!”. E HQ também!

Homenagem de Marcio Baraldi a Roberto Guedes
(clique na imagem para vê-la ampliada)

Alô! Alô! Hoje é sabadão, 22 de março de 2008. Estamos aqui na mansão do Baraldão! Mansão de caras... caras de pau!!! Estou aqui para entrevistar meu camarada Roberto Guedes, vulgo “Guedão”... o “Stan Lee brasileiro”! Autor do best seller A Era de Bronze dos Super-Heróis, lançado há pouco pela HQM Editora. O cara veio me fazer uma visita e nem pra me trazer um Ovo de Páscoa, pô (risos)?!? Pelo menos, consegui convencê-lo a fazer uma entrevista. Firmeza aí, “véio”?

Firmeza (risos)!

Aêê! Guedão... vamos começar do começo: você lembra como é que a gente se conheceu? Foi na banca que você tinha lá em Santo André! Eu procurava uns gibis antigos pra completar minha coleção e coloquei um anúncio no fanzine QI, do Edgard Guimarães. Você viu esse anúncio, me ligou e falou pra eu pintar na banca. Lembra dessa parada, mano?!?

Lembro sim. Foi um tormento. Você reclamou de tudo. Dos preços, das condições dos gibis... e no final comprou bem menos do que eu esperava(risos).

(indignado) Não é verdade!!! O André Valle e eu éramos os seus melhores clientes! Compramos revistas “pra carvalho” de você (risos)!!! Você ganhou muito dim-dim às nossas custas (risos)!!!

O Valle? Baita escorpião no bolso (risos)!

Engraçado, como é que você foi parar numa banca de revistas em Santo André?!? Que eu saiba você nem nasceu no ABC, certo?

Não! Sou paulistano. Morei no bairro do Ipiranga por mais de 30 anos. Minha família é toda de lá.

Seu pai tinha uma empresa na área de Construção Civil, não tinha?

Sim. No segmento de impermeabilização. Trabalhei por cerca de 10 anos lá, e depois saí. Pra contar como cheguei à Banca Fire Comics, é preciso contar algumas coisas primeiro...

Ah, tá! Mas antes me diz uma coisa: você fez Processamento de Dados e História, é isso mesmo?

Me formei no colegial como Técnico em Processamento de Dados. Foi logo quando a informática chegou ao Brasil, em meados dos anos 80. Mas naquela época eu já odiava computadores (risos).

E História? 

Estudei na Universidade São Marcos. Paralelo a isso tudo, estudei desenho na Escola de Arte Cândido Portinari. Ali na Praça do Correio. Mas não existe mais... acho.

Ah, eu já vi uns desenhos seus... você “tentava” desenhar, né (risos)?!?

É que eu cabulava as aulas de arte pra comprar gibis nos sebos lá do centro. Depois, eu percebi que os leitores gostavam mais de minhas histórias quando eram desenhadas por outros artistas (risos).

Você já fazia seus fanzines nessa época?

Na realidade – e isso pouca gente sabe – eu comecei primeiro escrevendo para editoras. Só depois é que me envolvi com a fanedição. A primeira editora em que coloquei os pés foi na GED (Galvão Editora e Distribuidora), que publicava a revista Porrada, editada pelo Gilberto Firmino. Isso foi em 1988.

E você também escrevia pras revistas do Tony Fernandes, da Phenix, né?

Sim. Eu conheci o Tony e o Wanderly Felipe (Vanderfel) quando ainda trabalhavam na Editora Ninja, ali na Praça da República.

Nesse período eu fazia a mesma coisa... fuçava as mesmas revistas. Era o que tinha de espaço na época pro Quadrinho brasileiro, né? Inclusive, eu lembro de uma história sua, sobre um roqueiro todo largado... sempre no sofá... (risos)

Alta Voltagem. Foi uma singela homenagem ao AC/DC. Mas tiveram outras. Algumas não foram creditadas.

Aquela sátira do “Surfista Afrescalhado” que saiu num daqueles gibis era sua? Lembro daquilo,ficou um sarro...

Não. Todo mundo me pergunta se aquelas tiradas de sarro em cima do Conan, do Hulk, etc., eram feitas por mim. O Vanderfel até me aconselhou a fazer HQs assim, pois seria um modo de escrever super-heróis, mas eu não queria avacalhar os personagens daquele jeito (risos).

Ah, eu faço um monte disso nas minhas charges lá no Bigorna... e tem aquelas paródias sensacionais da  MAD antiga também...

Não há dúvida, e sei que caras como Roy Thomas, Gil Kane e Wally Wood já fizeram algo do gênero, no passado; mas aquelas sátiras da Phenix eram muito mais barras-pesadas... sei lá, voltada para um público diferente. Preferia escrever minhas histórias sobre rock’n’roll mesmo, como a Alta Voltagem...

Pode crer! E com desenhos do Tony. Ele desenhava demais, eu gostava do desenho dele!!!

Deixa-me contar: certo dia, eu cheguei na editora com uma pasta debaixo do braço e ele disse: “Guedes, o que você tem aí?”, expliquei que eram as 4 primeiras HQs desenhadas do Meteoro, um super-herói de minha autoria. Ele respondeu: “Sabe, eu adoro super-heróis. Posso xerocar as histórias pra ler com calma?”. Concordei e fui embora. Tempos depois, fui visitá-los e Tony me mostrou a primeira história do Meteoro que eu havia escrito, já redesenhada, arte-finalizada e letreirada. Pronta pra ir pra gráfica.

Redesenhada pelo Tony?!?

Não. Por um sujeito chamado Cláudio Vieira. De acordo com o Tony, era um ex-desenhista do estúdio do Mauricio de Sousa. Vendo essa história hoje, percebe-se que seu estilo pende para o cartum mesmo. Só que o Tony mandou redesenhar o uniforme. Ele achou que colocar uma capa e um “M” no peito deixaria o personagem mais heróico do que com o uniforme todo negro que eu bolei originalmente. Tsc... na verdade, ele quis plagiar o Superman na cara dura. Inclusive esse “Meteoro de capa” era azul também... (risos)

Ahhhh, eu lembro dessa versão!!! Até tenho em algum lugar por aqui...

Pois é. A intenção dele era publicar a origem do Meteoro no Almanaque Phenix, que apresentava super-heróis de outros autores, como o Vingador Mascarado do Seabra, por exemplo.

Aaaah... era uma revista legal “pra carvalho”!!!!...

Exato. Mas a editora faliu antes da estréia do Meteoro. Daí o Tony virou pra mim e disse: “Guedes, pega esses desenhos e faz o que você quiser com a história. Afinal, ela é sua. Além disso, não vou ter como te pagar mesmo...”. Foi aí que lancei a primeira edição independente do Meteoro, impressão xerox, com tiragem de cem exemplares. A revistinha agradou e fiz uma segunda tiragem, que também se esgotou.

Na ocasião, você já fazia os seus fanzines?

Em 92? Sim. Produzia fanzines desde 1989. Comecei com o Status Quo Comics. Mas parei com os zines e fiquei só com as revistas em Quadrinhos. Como eu não sabia onde encontrar o Cláudio Vieira, coloquei um anúncio num fanzine dizendo que precisava de um artista pra desenhar o Meteoro. Foi aí que entrou em cena o Reginaldo Borges. Ele não era um profissional do ramo, mas adorava desenhar, e tinha um estilo bem calcado em Jack Kirby...

Eu lembro desse desenhista!!! Não foi ele quem desenhou Os Protetores?!?

Isso! Durante os anos 90 eu contei com muitos colaboradores em minhas revistas. Além do Borges, tive o prazer de trabalhar com Marcelo Borba, André Valle, Joe Prado...

O Prado do Art & Comics?!?

Sim, ele mesmo!

Meteoro 2008 - Botando pra quebrar (clique na imagem para vê-la ampliada)

E o Borba?!? Cadê o cara? Não foi ele quem desenhou aquela história do Meteoro contra um vilão aracnídeo?

Sim. Essa história saiu pela Escala e lhe valeu um Angelo Agostini de Melhor Arte-Finalista de 2002. O Borba é um cara muito talentoso que poderia trabalhar pra qualquer editora americana, caso realmente se dispusesse a isso. Mas como trabalha há anos como desenhista de uma grande indústria de bordado, acho pouco provável que vá trocar o certo pelo duvidoso.

Tá vendo?! Fazer bordado dá mais dinheiro que fazer Quadrinhos (risos)!!! Vamos todos virar bordadeiros, mulher rendeira (gargalhadas)! Eu comprei o Meteoro e Os Protetores na Livraria Muito Prazer, saca? Nunca imaginei que um dia iria conhecer o autor dessas revistas. Você começou a fazer seu nome nessa época, não é?

Exatamente. Eu consegui mais projeção com os fanzines e as revistas independentes que com as publicações da Phenix. Mas, claro, eu era apenas um colaborador pra lá de irregular da editora. Como as editoras não pagavam muito bem pelos roteiros, preferi não me enfiar de cabeça no ramo editorial. Assim, continuei com meu emprego “oficial”, investindo em minhas publicações alternativas quando sobrava uma grana.

Como você vendia suas revistas?

Pelo correio, e nas prateleiras das lojas Muito Prazer e Alex Comix. Havia também a Espaço do Emílio, mas esta fechou quando mataram o dono, algo assim. A Muito Prazer, do Valtão (Valter Fernandes) era o grande point dos curtidores de HQ... onde todas as tribos convergiam. Ficava num local estratégico da cidade: praticamente na esquina da Ipiranga com a São João. Foi lá que conheci gente importante como Franco de Rosa, Worney e até mesmo o Gedeone Malagola.

(surpreso) Sério?!? A loja era tão badalada assim?!? Eu comprei muuuuito gibi lá ,veio! Saía de lá carregado de gibi da EBAL...

Com certeza. Foi uma época boa pras produções independentes. O pessoal queria saber de novidades. O Franco resenhou vários fanzines meus em sua coluna na Folha da Tarde. O Worney também. Grandes entusiastas da HQB!

E não ficava caro bancar aquele monte de revistas e fanzines?

Um pouco. Mas à medida que as tiragens aumentavam, alguns desenhistas começaram a participar dos custos gráficos. Foi aí que nasceu o selo Fire Comics, em parceria com os desenhistas Cal e Borges, e do estudante de jornalismo Leandro Ciasca. A pretensão era transformar a Fire em uma editora. Em pouco tempo, de 300 cópias, passamos pra 500, e depois, para mil cópias, com impressão off-set e capa colorida. As publicações agradavam e estávamos conquistando um público fiel. Mas a “sociedade” não deu certo, e passei a tocar os projetos em parceria com o Marcelo Borba. Nessa altura dos acontecimentos, eu saí da firma do meu pai e perambulei por uma infinidade de empregos, até que surgiu a oportunidade de montar a Banca Fire Comics em Santo André, no final de 1997.

Aquilo era uma banca comum que você transformou num point especializado em Quadrinhos, né?

Desde o princípio, a idéia era essa mesmo. Só gibi.

Lembra que uma vez você sorteou um posterzão lindo do Crise nas Infinitas Terras lá? Eu tentei de todo jeito sabotar aquele sorteio e faturar o pôster mas perdi. Você NÃO me deu o pôster!!! Eu nem devia estar fazendo esta entrevista com você agora (risos)!!! E vendia muito gibi lá,véio?!?

(rindo) Nos dois primeiros anos, sim. Como foi na época em que o dólar e o real estavam emparelhados um por um, e a Fire era o único lugar a vender revistas importadas na região, conquistei um público fiel. Além disso, conheci muita gente boa e talentosa, como você, André Valle, Horácio Jordan, Helder Costa e o Antonio Costa – que é da área publicitária –, entre outros. Virou o reduto dos gibizeiros do ABC. Pelo menos, até 2001, quando me enchi do negócio.

Não foi em 2001 que você lançou o fanzine Gibilândia? Tem o selo da Fire Comics na capa. Olha aqui! (Baraldi pega um exemplar do número 1. Dossiê sobre a “Era Marvel”) Essa capa é do André Valle, né?!?

Não. É do Borba. Eu vendi a banca, mas continuava atendendo meus clientes, trazendo revistas importadas e fornecendo as nacionais antigas por meio do meu catálogo de revistas (Catálogo Fire Comics), que era algo único do gênero no Brasil.

Eu lembro do catálogo!.. Era muito legal! Mas o lance do Gibilândia...

Ah, sim... eu já estava totalmente desiludido com Quadrinhos, mas não queria sair do cenário editorial sem antes deixar alguma coisa bacana para a posteridade. Bonito, não (risos)? Assim, preparei uma série de ensaios sobre os períodos que achava mais legais nas HQs, como a Era Marvel... a fase do Kirby na DC dos anos 70... a trajetória dos heróis brasileiros, coisa e tal... só que eu mal podia imaginar que, por causa desse fanzine, acabaria por ser convidado a trabalhar numa editora de novo...

Na Opera Graphica!!!

Exato! O Franco me disse que eles precisavam de alguém que entendesse bastante de Quadrinhos...

Pô,aquele emprego te caiu do céu, né, véio?!?

Foi Deus... o tempo todo agindo. Ora, cheguei na redação pensando que era pra trabalhar como tradutor freelance, mas o Carlos Mann – que nunca tinha ouvido falar de mim – me colocou de cara como editor de todas as publicações da casa. Todas!!!

Aí começou uma fase muito boa pra você, né? Seu nome, enfim, ganhou muito mais projeção. Aqueles seus artigos sobre Quadrinhos que saíam nas revistas da Opera, cara...

Sim. Os caras me disseram: “Você é o editor! As revistas são suas... se vira!” De cara, instituí o Boletim HQ, na segunda capa de todas as revistas...

Eu lembro! “Do carvalho”, aquilo!!! Era um lance que lembrava a coluna Notícias em Quadrinhos da EBAL...

Exato! Ou a Stan’s Soapbox. Achei que seria um canal de comunicação legal com os leitores. O cara lia aquilo e se sentia como parte de algo maior. Nunca curti revistas que só trazem as histórias e pronto. Sempre gostei de ler, além das histórias, artigos, cartas, colunas, etc. Falando em cartas, só lamento o fato de não conseguir implementar uma seção dessas na revista 100 Balas.

Por quê? O pessoal não mandava cartas ou e-mails?

Pra 100 Balas, raramente. Pra Batman Saga e Stripmania, sim. Aos montes. Acho que o público de material antigo é mais fiel. Mas 100 Balas rendeu muitos prêmios pra Opera. Fico satisfeito de ter participado disso...

O Batman Saga vendia bem?!?

Acho que vendia sim. Quando a Panini pegou o material da DC, tivemos de cancelar a revista Batman: Lendas do Cavaleiro das Trevas, que trazia material mais moderno. Mas podíamos publicar material antigo, “pré-Crise”. Daí, eu vim com a sugestão pra lançarmos a Batman Saga – o nome, inclusive, foi idéia minha – só com histórias e autores selecionados, como Neal Adams, Alex Toth, Walt Simonson, etc. E ainda encaixamos alguns autores nacionais pra fazerem as capas, como Alexandre Jubran, Renato Guedes e Mozart Couto. A revista só foi cancelada – e isso eu lembro bem, pois fui comunicado por telefone pelo Franco – porque a licenciante teria nos proibido de lançar mais material de Batman em cores. No final, ficamos sem o Batman e qualquer outro super-herói da DC. As pessoas gostavam muito do estilo da Batman Saga, e até hoje comentam comigo como a revista era bacana. Acabou até virando verbete no dicionário do jornalista Silvio Ribas...

As tiragens da Opera eram pequenas, né?

O material distribuído para livrarias e comic shops via HQ Club, sim. E nem poderia ser diferente. Stripmania, por exemplo, era pra banca, com tiragens maiores.

Na sua opinião, quais os motivos que levaram a essa queda nas vendas dos gibis? Pô, eu lembro que na nossa época de moleque, os gibis da Mônica vendiam... sei lá, uns 200 mil?!? E o Homem-Aranha na época da EBAL, Bloch... até no começo da Abril... vendia muito, né?

Cada um tem uma teoria: videogame, televisão, analfabetismo... acho que dá pra pegar um pouco de tudo pra montar um panorama. Mas creio que a Internet contribua bastante pra essa apatia toda também. A Internet, cada vez mais, está a redefinir o dia a dia das pessoas. Seja nos negócios, nos costumes e mesmo nos relacionamentos mais íntimos, como namoro e casamento. Até mesmo gibi as pessoas estão lendo pela Internet. Não estou dizendo que aprovo ou não essas coisas, mas isso, com certeza deve contribuir para o desinteresse pela leitura e a compra de gibis, livros e jornais. Tem gente que passa mais de 12 horas por dia em frente a um computador. É uma mudança de hábitos significativa.

É verdade! Viva o “antropólogo Dr. Guedeeeeees”!!! Você matou a charada (risos)! Já reparou que a molecada de hoje escreve mal pra carvalho? É só ver no Orkut! A galerinha conjuga mal os verbos, não conseguem explicar nada direito...

O ensino público está uma calamidade. Uma pesquisa recente apontou a dificuldade do aluno de ensino médio em compreender um texto simples ou mesmo de formular uma redação.

Quando você começou a ler Quadrinhos? Qual foi seu primeiro gibi?

Comecei criancinha. Eram uns Quadrinhos de terror, acho que da Taika.

(surpreso) Sério?!? Não foi como todo mundo, com Disney ou Mauricio de Sousa?

Não! (risos) Mas logo em seguida vieram os gibis de super-heróis. O primeiro da minha coleção foi o nº 2 do Namor da Bloch. Foi quando enlouqueci (risos)!

Eu lembro desse gibi!!! Namor brigava com o Capitão Marvel e com o Hércules. São lindas essas histórias,mano! Sal Buscema em início de carreira. Roteiro do Roy Thomas. Você virou “brother” do cara, né(risos)? 

Não chega a tanto, mas consegui manter um bom contato com ele. Foi minha primeira entrevista internacional. Acho que deu certo, porque, de certa maneira, Roy é como nós. Começou na fanzinagem, continua fazendo sua revista Alter Ego, e adora super-heróis. E no final da entrevista, em “off”, comentei com ele que comecei a ler Marvel por causa daquela HQ do Namor. O cara ficou supersatisfeito em saber disso e me contou mais um monte de detalhes sobre aquele período... coisa de fã mesmo. Identifico-me muito com Roy Thomas!

E da DC,você gostava?

Comecei a ler na mesma época. A EBAL ainda lançava as revistas Superman, Batman e Superamigos em formato americano e em P/B. Adorava tudo aquilo. E Fantasma e Mandrake pela RGE também. Sempre foram os meus heróis...

Mas o cara que te fez pirar mesmo foi o Stan Lee, né?!? O Meteoro antigo lembra muito o Aranha da fase do Steve Ditko...

Eram as minhas influências. Conheci o Aranha na fase do Ditko. Ler o Aranha de Lee e Ditko foi como uma “revelação”. Daí, veio o período de John Romita, aquelas histórias com festinhas, Flash Thompson indo pro Vietnã, Peter paquerando Gwen e Mary Jane. O “caldeirão” de influências pra concepção das primeiras histórias do Meteoro se estendeu pra fora dos gibis também. Eu peguei todo aquele período da Discoteca, do Punk Rock... dos filmes Grease e Embalos de Sábado à Noite... até mesmo da novela retrô Estúpido Cupido...

Eu lembro!!! Celly Campelo... Tony Campelo...

Isso! Era o universo teen da época... aquilo tudo marcou muito. E antes que a década acabasse, a RGE lançou o Nova por aqui. Diferente do Peter Parker, que poderia ser um super-herói mesmo sem os poderes de Aranha, devido ao seu intelecto – ele criou a teia sintética, lembra? – Richard Rider era um zero à esquerda, sem qualquer qualificação. Foi quando pirei pela segunda vez (risos).

O Nova é do Roy Thomas?

Não, é criação do Marv Wolfman. Inclusive, quando o entrevistei, só falamos do Nova (risos).

Você entrevistou ele também?

Sim. Saiu em uma das edições da Wizmania. Perguntei o que ele faria na série, caso voltasse a escrevê-la. Respondeu que achava difícil voltar pra Marvel. É que anos atrás, Wolfman processou a editora, na esperança de reaver os direitos do Nova e do Blade. Ele acabou perdendo a parada. Naquela época, nos Estados Unidos, quando você criava um personagem os direitos ficavam com as editoras. E olha que o Nova foi publicado originalmente na época em que Wolfman ainda era fanzineiro. Está lá registrado na “Biblioteca Nacional” deles. Mas não adiantou nada. Mesmo Lee e a família de Kirby não possuem quaisquer direitos legais sobre Quarteto Fantástico e Thor, por exemplo. Pertencem à editora.

Você não acha que depois da saída do Stan Lee dos Quadrinhos, os comics começaram a despencar? Não tá uma coisa muito decadente hoje em dia? Até a Era de Bronze, OK... mas os anos 90, pra mim, foram um lixo! Você não acha também?

Capa do livro A Era de Bronze dos Super-Heróis (clique para ampliar)

Hmm... com algumas raríssimas exceções, dá pra concluir que a coisa foi meio tenebrosa nessa fase, realmente. A década de 90 representou a época dos autores despreparados e deslumbrados. Já a Era de Bronze, como mostro no livro (A Era de Bronze dos Super-Heróis), representou a ascensão da primeira geração de fãs ao profissionalismo, casos de Steve Englehart, Len Wein, John Byrne, Frank Miller, etc. Esse pessoal todo bebeu na fonte da Era de Prata e foi acolhido pelos veteranos que inventaram a coisa. Até por isso, a Era de Bronze foi um período de transição muito rico em termos de tendências criativas e mercadológicas.

Você acha que não há tradição no Brasil pra se produzir super-heróis nacionais? Eu acho que o brasileiro é tão criativo quanto qualquer um. E você?

Concordo. O que falta ao autor brasileiro são editoras dispostas a investir nele.

Bom, depois da fase da Opera, você passou um tempo na Panini, onde editou os primeiros Masterworks, ou Biblioteca Histórica Marvel, no Brasil. Eu peguei os quatro primeiros volumes e adorei a tradução! A qualidade gráfica tá perfeita, e a edição maravilhosa!!!

Que bom! Foi uma honra ser convidado pra ser o primeiro editor dessa série no Brasil. Eu já prestava serviço pra Mythos, por indicação do Franco, que já estava por lá. Escrevi uma revista infantil sobre pingüins, alguns textos de cinema e traduzi alguma coisa do Fantasma. Logo depois, o Hélcio de Carvalho me chamou pra tocar esse projeto pra Panini porque eu tinha uma experiência pregressa como editor da linha de encadernados de luxo da Opera Graphica. Mas eu jamais fui funcionário registrado da Panini. Eu trabalhava (ainda trabalho) em casa e só aparecia por lá algumas vezes por semana pra pegar material ou pra fechar alguma edição. Nesse processo, acabei por colaborar com alguns títulos mensais também, que andavam meio atrasados.

Você tá preparando mais algum livro?

Sim. Um deles, claro, é sobre Quadrinhos. Será em parceria com um amigo. O outro, se trata de um projeto diferente: um romance.

Olha aíííí!!!! Em primeira mão essa notícia!!! Guedão vai virar romancista!!! Qual é a temática? Algo voltado pro público jovem?

Por aí. A história se passa entre o final dos anos 70 e o começo dos 80...

Mas você adora esse tema, hein (risos)?!...

Pois é. Tem muita coisa legal pra se contar sobre esse período. E como eu vivi aquilo tudo com muita intensidade (risos)...

Firmeza! Então vamos encerrar. Ô, cambada! Vê se comprem A Era de Bronze dos Super-Heróis, pois o livrão está demais,falou?!! Ajudem o Guedão a ficar mais rico e me dar finalmente um pôster do Crise nas Infinitas Terras (gargalhadas)!!!! Caboclo pão-duro (risos)! Fora da minha casa já (gargalhadas)!!!!

(risos) Valeu, Baraldão! Abraço!

Mais fotos e imagens (clique nos links para vê-las)
1 - Spider, Leo e Guedes
2 - Guedes e Primaggio Mantovi
3 - Guedes e Pitombo
4 - Guepardo 1998
5 - Guedes e Baraldi
6 - 1955
7 - Alta Voltagem
8 - Meteoro 1992 - Primórdios

O Bigorna.net agradece a Roberto Guedes pela entrevista, concedida em 22/03/2008

(fotos e imagens: Roberto Guedes)

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