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Crise nos Infinitos Gibis - Parte 1 (O Mangá e o mito da nova tecnologia)
Por Gonçalo Junior
31/05/2006

"Mangá é tudo igual". "Mangá é lixo". "Mangá é porcaria". "É culpa da praga do Mangá".
 
Não, as frases não são de minha autoria. De vez em quando, nos últimos cinco ou seis anos, tenho ouvido algo assim. Desde que a JBC e a Conrad começaram a inundar as bancas brasileiras com quadrinhos japoneses no final da década passada, que os nostálgicos e puristas - leia-se, leitores novos ou da velha guarda de heróis e super-heróis americanos, editores de fanzines e alguns artistas brasileiros - declararam guerra aos Mangás.

A arma no começo se chamava desprezo. A regra agora é reagir: não li, não gostei. Se alguém consome, é rotulado um alienado ou algo parecido, em certo sentido. E seu gosto pode acabar irremediavelmente comprometido, alvo de chacota. Não foram poucas as vezes que também li comentários raivosos e preconceituosos contra o gênero na Internet nos últimos tempos. Alguns bastante agressivos até. Quase sempre equivocados porque deixam claro completo desconhecimento do tema e generalização. Tanto quanto condenar esses quadrinhos com bonecos cabeçudos e olhos grandes, muitas vezes infantilizados, é preciso tentar compreender o fenômeno. Creio que isso é fundamental para explicar ou ajudar a entender a crise sem precedentes que passam os Quadrinhos de banca no Brasil e que, sem querer ser alarmista, pode comprometer todo o mercado em longo prazo - voltarei a isso futuramente. Uma pergunta, de imediato, faz-se necessária: se os gibis estão em crise, por que mangá vende muito, bem acima que a média dos outros gêneros?

Antes de dar a minha opinião, algumas considerações. Tem sempre um editor ou diretor de editora que procura justificar sua incompetência profissional ou um acadêmico que se diz "especialista" em mercado de Quadrinhos que repete como um papagaio que as quedas nas vendas dos gibis tem a ver com Internet, videogames, RPG, desenhos animados e TV paga. Já disse em algumas palestras e volto a repetir: a questão é mais complexa e precisa ser discutida. Houve até quem afirmasse que a violência teria afastado as crianças das bancas de jornal e, por isso, as vendas teriam caído. Besteira. Que criança não alcança o jornaleiro da esquina? Entendo que só um imbecil ou um desinformado diz que Mangá é tudo igual. Circularam e circulam títulos que provam haver obras-primas no mesmo nível daqueles trabalhos assim considerados no Brasil, quase sempre de origem americana e alguns europeus. Não vou muito longe. Cito apenas Gen - Pés Descalços, Preto & Branco, O Vampiro que Ri (os três da Conrad), Mother Sara (vendido por aqui pela Meribérica) e, óbvio, Akira (Globo) e Lobo Solitário (Panini).

O ponto onde queria chegar: a crise nos Quadrinhos de banca tem a ver com um já demorado problema de criatividade que afeta tanto o universo dos super-heróis quanto das revistas infantis - que o diga a Abril e sua cambaleante linha Disney. Basta observar o que se considera de qualidade hoje e o quanto faz sucesso as reimpressões e reedições de obras já consideradas clássicas. Alguém aí quer tentar ler um gibi da Marvel ou da DC desses que estão sendo publicados pela Panini e pela Mythos que não seja material antigo? Se não acompanhou os dois universos nos últimos cinco ou dez últimos anos, talvez não consiga compreender muita coisa. Ao desespero do mata-mata de personagens, renascimentos e ressurreições e às criações de incontáveis novos universos, realidades alternativas e paralelas ou superseres somam-se os borrões gráficos em tom escuro que tornam a missão de visualizar as páginas não uma diversão, mas um martírio para míopes.

Falo como leitor de super-heróis, que começou a consumi-los nos tempos da Bloch Editores e da Ebal em 1975 e o faço até hoje. Desde a minissérie Marvels, de 1994, arrisco a dizer nada de interessante surgiu por aqui na Marvel e na DC - não acompanho o que sai lá fora, mas imagino que os editores brasileiros procuram reproduzir aqui o melhor ou o menos pior que encontram lá. Felizmente, as editoras independentes têm preenchido com competência essa lacuna. Não quero aqui antecipar outro debate, mas é preciso desmistificar a Marvel e a DC. Elas estão putrefatas e depois voltarei a isso. Descontada a culpa da Internet, dos games, e da televisão, os quadrinhos estão sumindo das bancas por causa da mesmice, da falta de inventividade, de boas idéias que vão além de experiências radicais de editores inconseqüentes. Isso vale tanto para os super-heróis quanto para os infantis, repito. Por outro lado, são necessidades que a molecada encontra nos Mangás: novidade sim, com seu exotismo da cultura oriental. O que justificaria o esforço de se acostumar a ler de trás para frente, então? Só muito interesse em consumir.

É óbvio, portanto, que leitores para Quadrinhos existem em todas as idades. Dê-lhes um prato atraente que virão correndo. Como num bom restaurante. É muito simples xingar, censurar quem lê Mangá e fechar os olhos para o declínio dos Quadrinhos de super-heróis da Marvel e DC. Eu, no meu canto, continuo de olho nos Mangás, à espera de coisas legais para ler. Que não sejam subprodutos enlatados como aquela história da garota do espinafre, que mais parece decalque de fotos com papel vegetal. Quem foi mesmo que fez aquilo?

O papo continua...

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