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Entrevista: Gabriel Bá e Fábio Moon
por Wilson Vieira*
25/07/2005

Porque Moon e Bá?

Gabriel Bá - Bá é um apelido desde criança, pois o Fábio não sabia pronunciar a letra "G", então era Babiel, Babinho e Bá. Moon foi bem mais tarde, na adolescência e descoberta das mulheres, uma coisa de bilhetes de amor secretos que acabou pegando e ficou.

Fábio Moon - Pois é. Acho que, para bem ou para mal, esses "nomes artísticos" pegam e acabam ficando na boca das pessoas.

Quando tomaram gosto pelo Quadrinho?

GB - Desde a infância, sempre lemos muitos Quadrinhos. Não tínhamos muito critério, líamos tudo que caísse na nossa mão, desde Mônica e Disney, passando pelos super-heróis até Moebius e Manara e chegando em Fradim, Chiclete com Banana e Piratas do Tietê. Isso desde muito cedo mesmo, porque nossa mãe sempre gostou de quadrinhos e lê até hoje.

FM - Acho que esse negócio de ler tudo o que aparecesse nos deu essa idéia de que qualquer tipo de histórias podia ser contada em quadrinhos, e essa constante descoberta de novas histórias nos alimentou através dos anos, das revistas e dos estilos

Tiveram algum modelo? Trilharam os passos de algum ídolo?

GB - Sempre gostei do universo de personagens do Laerte, que conheci ainda na Chiclete com Banana na década de 1980. Pra mim, sempre foi o melhor desenhista nacional, conseguindo traduzir com simplicidade os cenários mais complexos e as emoções mais profundas. Um verdadeiro poeta que nunca deixa de me impressionar. Também gosto muito dos americanos Frank Miller e Mike Mignola, que depois de trabalharem muitos anos na indústria de super-heróis, criaram seus próprios universos e puderam desenvolver seus estilos, tanto no desenho quanto nas histórias. Acho que os dois mudaram o mercado americano de quadrinhos quando se diz respeito aos limites do traço e ao uso de luz sombra pra passar emoção nas histórias.

FM - Acho que o Will Eisner foi, juntamente com o Laerte, a maior influência. Não só pelo traço dos dois, mas pelo universo urbano que tanto nos é familiar, pelas histórias de pessoas como todos nós, que encontramos na rua e por quem nos apaixonamos. Acho que eles dois seguiram caminhos em que o artista tem algo a dizer sobre o mundo, algo que ele diz em suas histórias, e é isso que eu sempre quis fazer.

O que mais atraem vocês... a imagem... o argumento... ou a história?

GB - Acho que muitos quadrinhistas começam apaixonados pelo desenho e esse é o meu caso. No entanto, nunca pensei em ser somente desenhista, pois sempre pensei em aventuras e histórias, mesmo que muito simples. Hoje, vejo que a história é, muitas vezes, mais importante que o desenho, então não basta ter uma arte bonita e uma trama fraca. Por isso dou muito mais atenção às histórias que contamos.

FM - O que sempre me atraiu foi a história, mas não somente as palavras, os textos. A atração está em como é contada a história, o que requere uma interação entre o texto e a imagem. Poder brincar com as imagem em junção com o texto é a poesia das Histórias em Quadrinhos.

Pretendem publicar na Europa?

GB - Queremos muito conseguir atingir o público europeu com nossas histórias, mesmo não sabendo muito por quais caminhos poderíamos fazer isso, pois são muitos mercados, cada um distinto do outro e não temos familiaridade com as editoras. A Devir, editora que publicou nosso último livro aqui no Brasil (N. do E.: o álbum Crítica), tem filiais em Portugal e nosso livro também será vendido lá. Eles também têm uma filial na Espanha que pode se interessar pelo livro. Nosso livro Meu Coração, Não Sei Por Que, publicado no Brasil em 2001, foi lançado nos EUA em 2004 sob o novo nome Ursula e chamou a atenção de uma editora italiana e deve ser publicado ainda este ano por lá. (N. do E.: Isso acaba de acontecer. A editora Lian lançou Ursula.)

FM - Estamos tentando encontrar editoras interessadas em publicar nossas histórias na Europa, pois acreditamos que tratamos de temas universais que podem ser apreciados em qualquer lugar. Todo mundo se apaixona, todo mundo sofre, todo mundo fica de ressaca.

Qual foi a receptividade de seus trabalhos nos EUA?

GB - Quando começamos a mostrar nosso trabalho mais autoral ao invés de tentar conseguir um trabalho como desenhistas, começamos a chamar mais atenção dos editores e artistas na San Diego Comic Con, convenção de comics para a qual já vamos há 8 anos. Com isso, conseguimos um convite pra participar da antologia Autobiographix da Dark Horse e publicamos nosso livro Ursula pela AiT/Planet Lar. As vendas do Ursula estão boas e temos boas respostas, tanto do público quanto da própria editora. Buscamos um lugar ao sol para nossas histórias e isso levará um tempo, mas não temos pressa. Queremos fazer o trabalho bem feito.

A visão de vocês sobre as HQs hoje, no Brasil?

GB - Existe muita gente com vontade de fazer HQ no Brasil e os autores estão procurando contar histórias mais pessoais e sérias, fugindo um pouco do gênero humorístico que domina no cenário brasileiro. As editoras têm apoiado mais os autores que se destacam e buscado publicar uma variedade maior de material estrangeiro, visando um público mais adulto e saindo do esteriótipo de super-heróis. No entanto, tudo ainda existe numa escala muito pequena, pois as vendas são pequenas e ainda vivemos num país com nível altíssimo de analfabetismo e pouca tradição de leitura.

FM - Estamos numa fase de transição. O mercado que temos na memória, das revistas em banca e das grandes tiragens, não existe mais. O novo mercado, dos álbuns de quadrinhos nas livrarias, ainda não se tornou um costume entre os leitores. Assim, não existe ainda o hábito de procurar pelo quadrinho onde ele está, e isso deixa o mercado lento.

O artista precisa ter paciência e continuar trabalhando, esperando o leitor encontrá-lo.

Gostam de fazer histórias longas ou curtas?

GB - Cada história tem seus desafios, algumas têm que ser curtas, outras precisam de muitas páginas pra poderem ser contadas. Ainda pretendemos contar uma série longa onde o leitor pode acompanhar a evolução de um personagem, os dramas de sua vida, suas conquistas e derrotas. Somente numa história longa é que se pode desenvolver essas coisas.

FM - Eu gosto mais de historias longas, gosto do desenvolvimento dos personagens com o decorrer da história, gosto de contar uma história em capítulos. Gosto da sensação de pequenos finais, capítulo depois de capítulo, que eu cresci lendo em grandes livros.

Nas HQs, qual a importância de terem estudado Artes Plásticas?

GB - Na faculdade aprendemos a história das artes e como elas são o reflexo da sua época, o que cada artista fez e o que significou. Vimos técnicas e vertentes artísticas diferentes que, mesmo não sendo usadas diretamente, nos dão mais ferramentas pra trabalhar nosso traço e estilo. Não se pode ficar fechado no mundo dos quadrinhos, é preciso olhar para o mundo e conseguir traduzir o que se vê na página. A faculdade de artes nos ensinou a olhar o mundo.

FM - Com a faculdade, você passa a pensar no propósito do seu trabalho, do seu estilo. Você estuda desenvolvimento da representação, a evolução da linguagem artística, e isso é bagagem que você carrega para os quadrinhos.

Vocês acompanham as HQs pelo mundo? Quais suas impressões sobre a Nona Arte?

GB - Não acompanhamos de perto o que está sendo produzido contemporaneamente no mundo, por falta de tempo e empenho em pesquisar melhor estes materiais. Cada mercado é muito diferente do outro e a língua é sempre um empecilho. Tentamos ver notícias na internet sobre lançamentos e eventos, mas não nos aprofundamos muito. Acho que ainda estamos muito focados em fazer as nossas histórias funcionarem e, quando estiver na hora de olhar para outras coisas, olharemos. Como eu disse antes, a arte é um reflexo de sua época e me interessa muito a época que vivemos e cada lugar a enxerga e retrata de uma forma distinta.

FM - Acho que os quadrinhos pelo mundo estão melhorando com os anos. Seja na Europa, nos Estados Unidos ou no Japão, acho que a tendência não é mais em estabelecer a qualidade gráfica de uma História em Quadrinhos, esse desafio já foi vencido. Acho que hoje as pessoas querem cada vez mais contar histórias que resistirão ao efeito do tempo, que realmente estão aqui não só para divertir, mas para registrar uma época, um pensamento, um sentimento.

Quais são as três obras em quadrinhos que não devem faltar na boblioteca de um apaixonado por HQs?

FM - Akira, Corto Maltese e Bone.

GB - Lobo Solitário, Watchmen e Sin City.

Entrevista originalmente publicada no site Comics Code.
* editado por Emiliano Longobardi, do Comics Code

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