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Fazendo sem olhar para o vizinho
Por Laudo Ferreira Junior
28/03/2007

Existe aquela velha idéia que no Brasil não existem bons roteiristas de Quadrinhos. Desenhistas aos montes, porém, roteiristas - segundo dizem - são escassos. Tirando como base algumas publicações antigas e atuais, pode se dizer que há muito material que circulou e circula por aí, realmente com deficiência se não de uma boa história, pelo menos de uma forma bacana de se contar. Mas por outro lado, me pergunto, ou pergunto a vocês: fraco de roteiro comparado ao quê? Roteiristas ditos mestres como Alan Moore, Neil Gaiman e Frank Miller, só pra citar alguns medalhões das HQs americanas?

Mas é aí que perdura uma dúvida em minha cabeça: Por que o parâmetro? Claro, porque são grandes escritores responsáveis por grandes obras. Indiscutível. Eu mesmo já derramei alguns “copos” de baba por algumas obras dos referidos mestres. Porém, é possível pensar que a trilha para se criar boas Histórias em Quadrinhos no país seja dispensar a base, a mira, o ponto de referência destes ícones? Não me refiro aqui a boicotes ufanistas ou qualquer coisa similar a estas obras e seus respectivos países, que é isso?! De jeito nenhum, pelo contrário, elas têm mais é que ser digeridas como estudo, como aprendizado, em todos os sentidos. Mas aí, aí é que acredito eu que o ponto de fuga tem que ter outros cantos. Já li muito texto de neguinho por aí, malhando os que fazem super-heróis brasileiros, longe também eu de defender quem faz, como também não acredito que dizer “Quadrinho brasileiro é aquela coisa de sertão, Copacabana”, compreendem? Muito menos defendo estes.

Então, qual é a sua, cara?” você há de me perguntar. “Quer ficar em cima do muro?”. Não, porque sou razoavelmente gordo e periga o muro cair. O que acho é que, ainda por mais que se negue ou se ache que não, temos muito material produzido aí sobre a intenção do comparativo. Quer os ditos super-heróis nacionais, quer não. E o pior, temos muitos editores de Quadrinhos aqui (!!!) que possuem “apenas o olho comparativo”. E isso não leva a lugar nenhum. Muitos dos nossos grandes autores nacionais como Shimamoto, Flávio Colin, André Diniz, Laerte, Angeli, os gêmeos Bá e Moon, Mutarelli, para citar apenas alguns do passado e do presente, produziram e produzem grandes trabalhos onde é perceptível a ligação, ou melhor dizendo, a “inspiração” vinda de outras fontes, de literatura, artes plásticas, música e até mesmo balé. Isso torna enriquecedora a obra produzida em que nós, como leitores, somos conduzidos a inusitadas leituras, inusitados assuntos, mesmo que corriqueiros, mesmo que intimistas e o mais importante, mesmo que despojados de qualquer conteúdo artístico e alicerçado no melhor do bom humor, no melhor apelo popular e afinal de contas, Quadrinho é cultura de massa, mesmo que hoje em dia esteja levado a uma cultura mais de livrarias do que de banca.

Isso é uma busca de identidade. Sim. Mas também não digo que já não haja identidade. Exemplos como os citados acima já deram e dão ainda boas amostras de possibilidades. Quadrinho é o meio que se conta. Quadrinho do Quadrinho, ou melhor dizendo, beber de uma só fonte, não enriquece nem quem faz, nem quem lê e isso mesmo em obras populares. Esta impressão de possibilidades de criação de uma boa e consumível História em Quadrinhos me veio recentemente quando li um personagem chamado Jack The Fag, do roteirista e editor José Salles. Uma porrada na minha cara. O personagem um homossexual que habita uma grande metrópole (São Paulo? Bem a cara...) e vive aí seu dia a dia convivendo com figuras estranhas, bizarras, humanas. Ao contrário do que se pode pensar, mesmo tendo um personagem gay como protagonista, o enfoque da série (que está no seu quinto número pela editora SM) são as pessoas e seus sentimentos, contado sem nenhum pretensão intelectual, “cabeça”,  pelo contrário, o autor e seu desenhista apenas nos contam a história. Ler esta HQ me fez questionar estas intenções de se criar um personagem ou uma História em Quadrinhos. Partir de si. Partir de um ponto zero.

Lembro-me de ter ouvido comentários semelhantes a respeito de duas obras distintas: a série Subversivos do Diniz e a série de tirinhas da personagem Katita da escritora e poetisa Anita Costa Prado. Na primeira vieram coisas como: “Que sacada do cara, fazer uma HQ falando sobre a ditadura!!!” ou no caso da Katita: “Legal, uma personagem de tirinhas que é uma lésbica, bem sacado!”. Aí me pergunto, ou pergunto a vocês: E por que não ???  Outras fontes, como disse. Há muita coisa por aí, em nossa vida, nos jornais, na televisão, na nossa imaginação doida que podem render boas histórias, bons personagens e por aí vamos.

Nada de ufanismos infantis de Quadrinhos nacionais. Brasilidade. Nada. Nada de pretender rivalizar contra um mercado (no caso americano) que mal sabe de nós e que produz muita coisa de extrema qualidade. Nada. Simplesmente olharmos pra nós, por nosso modo de pensar e no nosso modo de se divertir e querer divertir os outros. Em todos os sentidos. É difícil. É nada. Tá aí na nossa cara.

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