NewsLetter:
 
Pesquisa:

Teatro: Nekrópolis prima pela urgência cênica (SP)
Por Ruy Jobim Neto
26/05/2009

Nekrópolis está fazendo burburinho. A turma 10 da ELT (a prestigiosa Escola Livre de Teatro de Santo André, verdadeiro celeiro de talentos) está pisando no palco com este trabalho belíssimo, muito dinâmico, repleto de músicas de grande urgência. Podemos traçar um paralelo positivo, uma tradição que vem com peças musicais como Hair ou mesmo os trabalhos do Arena em textos de Guarnieri e Edu Lobo. A direção é de um dos mestres da ELT, Gustavo Kurlat, maestro e compositor (inclusive da música e das canções do longa-metragem O Garoto Cósmico, de Alê Abreu).

No elenco, mais de vinte atores-alunos. Foi um ano inteiro de processo, o resultado é extasiante. A história é extremamente contemporânea e gira em torno de um grupo de terroristas conhecido como “Estirpe” (delicioso nome, bem irônico). Eles são os ratos de uma sociedade que, à margem conseguem driblar o sistema e fazer ele olhar a própria cara. A peça enfoca que depois dos mais de 500 assassinatos cometidos pela ditadura militar brasileira, nos lamentáveis anos de chumbo (de triste memória), há hoje toda uma avanlanche de matanças e chacinas, grupos de extermínio e comandos criminosos, dentro daquilo que é chamado de “o Estado democrático de Direito”. No palco, está acontecendo o julgamento da “Estirpe”. Nós, da platéia, é que somos o corpo de jurados. Melhor ainda, a peteca é jogada para todos nós. Entre a favela e os advogados, resta toda a sociedade civil.

Segundo o programa da peça, belíssimo por sinal, a “Estirpe” é uma organização de excluídos, dos que vivem à margem da sociedade, e que por isso passam a desenterrar mortos, trazendo à tona os cadáveres de crimes impunes numa sociedade permissiva e totalmente visceralizada pelos meios de comunicação de massa. No palco, o questionamento de nossos dias é premente, de uma urgência que nos alerta, faz cair a ficha. Mostra a nossa cara, enquanto raça humana, seres viventes e brasileiros. Nekrópolis somos todos nós, que rimos da nossa própria desgraça ao abrir um jornal ou assistir a um telejornal. O fato de estar acontecendo à nossa volta, o tempo todo, como se fosse um Tropa de Elite ao vivo, é o que faz desta peça um aparato de enorme brasilidade, um olhar no espelho. O bonito da ELT é, além de formar bem seus alunos para os grandes palcos e montagens, também ter o propósito de formar público. O ingresso é gratuito, a platéia entope. Chega ao ponto de ter grupos enormes de pessoas sendo mandadas de volta pra casa por causa da lotação, explica uma das talentosas atrizes do elenco, a mineira Maria Cecilia Mansur, que também compôs duas canções da peça com Gustavo Kurlat e com outros colegas de palco. Segundo a atriz, haverá ainda um CD com a bela trilha sonora a ser lançado, o que é ótimo. Pelo material do álbum (que é o programa da peça, com todas as letras), será de excelência.

A movimentação cênica é primorosa, eletrizante, pulsante, e para realizá-la, o elenco teve preparação corporal de Juliana Monteiro. A consultoria de figurinos foi de Claudia Shapira. A preparação de ator ficou a cargo de Mariana Senne e Luís Mármora (dois talentos egressos da Cia. São Jorge de Variedades - e que também são atuais dois mestres na ELT, depois das passagens de Georgette Fadel e Cibele Forjaz por lá). O texto de Nekrópolis, fortíssimo, em alguns momentos tocante, noutros causticamente engraçado, mas principalmente contemporâneo, é de Roberto Alvim. São belas canções, atores jovens e sérios e uma iluminação (de Wagner Antônio) de encher os olhos, de nos deixar alerta. O palco está totalmente a descoberto, há poros por todos os lados. E o elenco inteirinho canta. E bem. O próximo fim de semana de Nekrópolis será o último na enorme sala da ELT, na sala Conchita de Morais, em Santo André. Depois a peça já tem agenda para Diadema, São Caetano e também se apresentará em Belo Horizonte. Vale muito a pena. E é de graça.
 
(foto: Eduardo Chaves / divulgação)

Serviço
Nekrópolis
Direção geral, dramaturgia musical e direção musical: Gustavo Kurlat
Dramaturgia e Texto: Roberto Alvim
Teatro Conchita de Moraes (da ELT) - Santo André-SP
Praça Rui Barbosa, s/nº.
Tel: (11) 4996-2164
Sábado e domingo, às 20h30
Grátis
Até 31 de maio

Quem Somos | Publicidade | Fale Conosco
Copyright © 2005-2025 - Bigorna.net - Todos os direitos reservados
CMS por Projetos Web