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Por Ruy Jobim Neto 26/10/2007
Espaços inusitados, um poeta-personagem famoso da Literatura. Um grupo premiado de atores, duas diretoras sob a missão de provocar cenicamente. Um texto homônimo e uma autora brasileira que está entre as mais prolíficas da atualidade - estes são os ingredientes para o espetáculo A Última Quimera, produção mais que talentosa da Cia. Les Commediens Tropicales, os mesmos que colocaram nos palcos recentemente a premiada Chalaça – a Peça, sob a direção de Márcio Aurélio. Do livro de Ana Miranda (autora consagrada de O Boca do Inferno e Desmundo), é a biografia do poeta Augusto dos Anjos em A Última Quimera (publicada pela Companhia das Letras) que vem à tona. Para cumprir a missão de explicar, confundir, encantar e atordoar a platéia presente, foram convocadas as diretoras Verônica Fabrini e Georgette Fadel (Prêmio Shell de Melhor Atriz por Gota D'Água – Um Breviário e diretora de Biedermann e os Incendiários e Do Que Orlando me Disse, entre outros). Juntas, elas têm a missão de provocar. E provocaram primeiro o grupo de atores, a partir do texto final de Carlos Canhameiro. O resultado coletivo final, no espaço cênico, é essa imperdível montagem da Companhia.
A Cia. concede ao público uma chave, e a possibilidade de podermos abrir portas juntos é total, basta estarmos abertos. Mesmo porque, em termos de representação histórica o livro (e a montagem, portanto) enfocam a construção de todo um Brasil novo, ainda republicano e (evidentemente) muito anterior à Semana de Arte Moderna - é o Brasil da Revolta da Chibata (de João Cândido), do retorno dos soldados da insólita Guerra de Canudos, da construção da Avenida Central, da gripe espanhola, de Oswaldo Cruz. Um Brasil extinto se abre com pesados ferrolhos diante de nossos olhos, como num caleidoscópio, como numa porta. O poeta-personagem enfocado pelos Les Commediens em A Última Quimera, por sua vez, tem dimensões que beiram a tragédia. Augusto (de Carvalho Rodrigues) dos Anjos, paraibano nascido em 1884 falecido em 1914 em Minas Gerais, foi identificado muitas vezes como simbolista ou parnasiano, mas muitos críticos, como o poeta Ferreira Gullar, concordam em situá-lo como pré-moderno. É conhecido como um dos poetas mais estranhos do seu tempo, e até hoje sua obra é admirada (e detestada) tanto por leigos como por críticos literários. O que Ana Miranda faz em seu livro é partir dos próprios versos (como experimentou anteriormente em O Boca do Inferno) e das cartas do poeta à sua mãe para recompor a atmosfera de sua obra e o itinerário de sua vida, mostrando poeticamente as inquietações metafísicas que o consumiam. Ao mesmo tempo, traça um painel dos costumes e principais acontecimentos da passagem do século XIX para o século XX. Na montagem dos Commediens, é confrontada a trajetória de Augusto dos Anjos com a de Olavo Bilac, que por sinal obteve o tão desejado reconhecimento em vida. Augusto, ao contrário, morreu miserável e esquecido, tendo deixado como herança à sua família apenas alguns exemplares encalhados de seu único livro, Eu.
Ao final de uma das apresentações, ainda no SESC, tive a oportunidade de conversar com duas atrizes do elenco. Enquanto Mariza Junqueira (que substituía Michele Navarro, que estava de licença maternidade, à época) lembrava as possibilidades estéticas que os fizeram escolher A Última Quimera, de Ana Miranda, em vez de O Boca do Inferno (que estava originalmente nos planos da Cia.), e de como foi o intenso processo criativo com as duas diretoras – aqui chamadas de provocadoras -, Paula Mirhan, atriz premiada por sua divertida atuação em Chalaça, mencionou a procura de espaços cênicos (em geral enormes e inusitados) para que o espetáculo pudesse ganhar toda a dimensão estética que a platéia recebe. Paula é cantora profissional e também solta a voz em A Última Quimera, em certo momento da encenação. Vale a pena ver e ouvir. Portanto, A Última Quimera se encontra à disposição daqueles que desejam ser provocados, no Teatro Sérgio Cardoso, no Espaço Marcenaria (Rua Rui Barbosa, 153, na Bela Vista). O espetáculo reestreou no dia 12 de outubro, depois de uma breve passagem pelo espaço da Unidade Provisória do SESC, na Av. Paulista. A temporada, assim, estende-se até 16 de dezembro, às sextas e sábados (às 21h30) e aos domingos, às 19h. Para quem quiser uma palhinha deste magnífico trabalho, é só dar uma espiada no blog do espetáculo, ou, ainda melhor, sentir a potência da Cia. Les Commediens Tropicales nesta sua atordoante investida poética, clicando no You Tube. Serviço Teatro Sérgio Cardoso |
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