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Por Mário Latino e Marcio Baraldi 15/08/2010
Gil Kane começou a trabalhar com quadrinhos no ano de 1942, aos 16 anos. Já nessa época, nutria uma exagerada paixão pelos pulps, que com os anos se estenderia à literatura clássica e à filosofia. Pelo que se sabe, seus primeiros trabalhos foram realizados em ritmo de encomenda para a MLJ Editora, cujo chefe era o lendário Harry Shorten. Oito meses mais tarde, Kane foi trabalhar como assistente de Joe Simon, na DC. Nessa época assinava suas pranchas com o nome de Eli Katz, Eli Kane, Gil Stack ou Al Kame, dependendo das circunstâncias. Aos 17 anos já conhecia artistas do nível de Joe Kubert, Charles Biro, Bob Montana, Carmine Infantino, Sparling e Al Plastino. Na DC, Gil Kane trabalhou por algum tempo com Joe Simon e, às vezes, com Jack Kirby. Quando estes foram convocados pelas forças armadas, a DC passou um roteiro de Newsboy Legion para que ele desenhasse, mas parece que não agradou e, da noite para o dia, Kane viu-se no olho da rua. Após esta infeliz experiência, Kane foi trabalhar por um breve período com Mac Raboy no título Captain Marvel Junior. Mais tarde, ele foi parar na Continental Comics, onde dividiu espaço com Infantino e Harvey Kurtzman, antes de ser convocado pelo exército, no verão de 44. Nos 18 meses que Kane esteve no exército, até ter dado baixa em dezembro de 1945, a indústria dos comics entrou em crise de forma que, quando voltou, não havia mais trabalho para ele. Utilizando antigos contatos, arrumou trabalho na DC, para a qual desenhou o western Hopalong Cassidy até 1947. A reviravolta na carreira de Gil Kane veio em 1959, quando o roteirista John Broome recebeu a encomenda de resgatar um dos heróis da Era de Ouro dos Comics, The Green Lantern (Lanterna Verde). Broome convidou Kane para trabalhar com ele como desenhista e, graças a seu domínio da perspectiva, da anatomia e da narrativa, aquele primeiro número das aventuras do gladiador esmeralda converteu-se num marco das HQ. Se a contribuição do artista ficasse por aí, ainda assim ele teria assegurado um lugar entre os mestres dos quadrinhos. Mas Kane ainda ficaria mais célebre pelo seu trabalho com The Atom (Elektron) para a mesma DC. Nessa época, anos 60, Kane havia alcançado um primoroso e inconfundível estilo próprio. Seu desenho inovador, repleto de ângulos cinematográficos, enquadramentos ousados e a anatomia elástica e movimentação acrobática de seus personagens se tornaram suas marcas registradas e eram reconhecíveis a kilometros de distância! Não e exagero dizer que Kane, a exemplo de Jack Kirby, Jim Steranko e Neal Adams, era um artista muito a frente de seu tempo. Enquanto a maioria dos artistas seguiam padrões estéticos, Kane inventou um padrão novo, totalmente dele! Enfim, um gênio! Nessa época Kane desenhou vários outros personagens da DC como Turma Titã, Rapina e Columba, Batgirl, entre outros.
Nos anos seguintes, Kane tornou-se o mais prolífico artista da Marvel, depois de Jack Kirby. Um cálculo superficial do seu trabalho dessa época aponta que ele chegou a fazer 900 capas e que desenhou, praticamente, todos os personagens da editora! Do Hulk ao Capitão América, do Punho de Ferro ao Coisa, nenhum personagem escapou de seu traco exuberante, que estava então, mais lindo e maduro que nunca! O início da carreira de Gil Kane na Marvel coincidiu com a decisão de Stan Lee de deixar os roteiros em mãos de outros escritores. Kane foi, de cara, designado para o título mais importante da editora, The Amazing Spiderman. Trabalhando em equipe com o roteirista Roy Thomas, o desenhista estabeleceu uma das melhores parcerias que a história do ‘comic’ moderno tem registro. Juntos, Kane e Thomas produziram uma das fases mais sensacionais do Homem Aranha! E deste período a transformação de Peter Parker num monstro com seis braços, o envolvimento de Harry Osborn com drogas ou a polêmica morte de Gwen Stacy e do primeiro Duende Verde. Uma fase de arrasar! Numa entrevista concedida em 1996, Kane reconheceu aquele período como “o mais feliz de toda minha vida”! Mesmo trabalhando para a Marvel, Gil Kane continuava procurando novos caminhos para a arte dos quadrinhos. Em 1971, ele assinou contrato com a Bantam Books, pelo qual se comprometia a produzir, em parceria com o saudoso Archie Goodwin, oito novelas gráficas de um épico da ficção científica que se chamou Blackmark. A série misturava elementos do gênero capa e espada com a fantasia de Edgar Rice Burroughs. Da mesma forma que com Savage, Blackmark teve problemas de distribuição. A série foi cancelada depois do fracasso do primeiro número. Kane chegou a terminar um segundo volume, que acabaria sendo publicado pela Marvel. Coincidindo com o lançamento de Blackmark, Roy Thomas iniciava a adaptação para os quadrinhos dos romances de Robert Howard, com Conan, o Bárbaro, como protagonista. Kane foi trabalhar com Thomas e desenhou dezessete números de Conan! Todos primorosos! Em 1977, ele e o escritor Ron Goulart criaram, para os syndicates, a tira de ficção científica Starhawks. Numa época em que a tira de aventuras não tinha mais espaço nos jornais, eles conseguiram a façanha de publicá-la por quase sete anos!
Foi, então, que surgiu a oportunidade de trabalhar com desenho animado. Em 1984, mudou-se para Califórnia, onde fazia storyboards para Marvel Productions. Depois passou a desenvolver projetos de animação para ABC. Essa experiência durou cinco anos. “Foi muito gratificante. Pela primeira vez em anos, estava ganhando dinheiro de verdade”, declararia num entrevista em 1998. Trabalhar com animação lhe permitia fugir das limitações que a página do ‘comic book’ impunha, deixando à solta a imaginação e a capacidade criativa. Mas aí Kane acabou descobrindo que trabalhar com animação podia ser uma experiência frustrante. Para começo de conversa, todo o material produzido estava destinado ao público infantil, bem diferente daquele que ele tentava atingir com seus quadrinhos! Para piorar as coisas, ninguém parecia interessado em escutar o que ele tinha a dizer.
Foi enquanto terminava esse trabalho que Kane teve seu primeiro encontro com o câncer. Para combater o linfoma, se submeteu à quimioterapia e radiações. Como resultado do tratamento, seu coração quase entrou em colapso. Foi necessária uma operação de coração aberto. Kane que, sempre fora um homem vigoroso, era agora uma sombra dele mesmo. Mesmo doente, Kane não parou de trabalhar. Era como se, consciente do pouco tempo de vida que ainda tinha, tentasse deixar sua marca no mundo. Eli Katz ou Gil Kane – como seus admiradores o conheciam – morreu no 31 de janeiro de 2000. Tinha 73 anos de idade. Muitos artistas tentaram imitar Kane nestes anos todos mas jamais surgiu alguém com o talento e a magia de seu traco! Kane era único! Ele realmente conseguiu deixar sua marca do mundo! |
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