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Entrevista: Ricardo Giassetti
Por Matheus Moura
22/08/2008

Quando o assunto é publicidade, Ricardo Giassetti é redator para marcas como Philips, Mercedes-Benz e Chrysler. Quando é jornalismo, escreve artigos para revistas como Grandes Guerras e Aventuras na História. Quando é roteirista, escreve histórias como Down the river e o novo O catador de batatas e o filho da costureira, recém-lançado na Bienal do Livro de São Paulo. Como editor, já trabalhou com Sin City, Sandman e muitos outros... e criou a Mojo Books. Esses últimos trabalhos que incluem O catador de batatas publicado pela Editora JBC, em comemoração aos 100 anos da imigração japonesa - um livro que tem um formato inédito, unindo a leitura dos Quadrinhos ocidentais com o mangá oriental, levando o leitor a um mesmo final para duas histórias no meio do livro; a tradução do álbum Os Invisíveis – Revolução 1, lançado pela Editora Pixel; e a Mojo Books são o assunto desta entrevista. Aqui, ele fala um pouco a respeito dele e sua editora 100% digital - e gratuita! – Mojo Books, a qual recentemente estreou uma seção dedicada às HQs.

Mojo Books?

Mojo Books é uma coleção de livros digitais que lancei com meu amigo Danilo Corci em dezembro de 2006. A Mojo Books assumiu um papel de vanguarda no mercado editorial brasileiro. Somos a primeira editora 100% digital do Brasil com uma proposta que desperta o interesse do público, profissionais e novos escritores. A sacada genial é trabalhar literatura aliada à música: "Se música fosse literatura, que história contaria?" Atualmente os mojers já são mais de 40 mil, temos cerca de 80 e-books lançados e abrimos outras frentes como os Mojo Singles, os Remixes e os Comix. Importante esclarecer que todo o conteúdo disponível no site da Mojo Books é gratuito graças ao investimento e trabalho que fazemos através da Mojo Ltda e da colaboração de nossos parceiros.

As novidades anunciadas com o novo site (no início do ano), todas já foram cumpridas, ou ainda há mais por vir?

Sim, basicamente todas foram cumpridas dentro do cronograma planejado em 2007. Lançamos os produtos novos (Singles, Comix, etc), estamos preparando a Mojo Shop, nossa loja de produtos físicos (camisetas e coisas bacanas), e uma festa semanal que será um ponto de encontro para escritores, músicos e mojers em geral.


A Mojo, recentemente, estreou a Mojo Comix com a quadrinização de Bauhaus - Bela Lugosi is Dead, feita por Raphael Salimena e Leo Martinelli. A receptividade dos Comix está como esperada?

Os Comix são campeões de download disparados. Lançamos apenas dois por enquanto e tivemos um retorno incrível! A idéia era lançar os Comix de dois em dois meses, mas já recebemos cerca de 15 roteiros e temos outros seis Mojo Comix em produção, entre eles Rock'n'Roll all nite (Kiss), Weird Science (Oingo Boingo), Abigail (King Diamond), Cansei de Ser Sexy, Titãs, Depeche Mode, Jimmi Hendrix e outros. O próximo a ser lançado é Rodo Cotidiano (O Rappa) de Ramon Cavalcante, do Ceará. Importante lembrar que a Mojo Comix começou com um número zero, de autoria de Dennis Anderson e Jean Okada, filhote de um projeto que fizemos e não publicamos em 1991: Strawberry fields forever, dos Beatles. Prometo novidades para os Comix - não só de lançamentos - muito, mas muito bacanas para 2009. Aguardem! Só não aguardem mais tempo para enviar suas propostas.

Por que pensar em Quadrinhos hoje?

Hoje não, sempre. Hahaha. Eu aprendi a ler vendo HQ, eu fazia HQ como trabalho de escola, eu passei de adolescente para adulto trabalhando com Quadrinhos. Os Quadrinhos na Mojo foram praticamente uma obrigação, tanto pela satisfação pessoal quanto por serem um tipo de suporte que tem tudo a ver com música. O mercado de Quadrinhos está passando por uma revolução no Brasil. Nossa turma de Quadrinhos, o pessoal que fez o Gunned Down para a Terra Major - publicado no Brasil como Bang bang pela Devir -  está fazendo história, dando um passo além e sendo respeitados como autores dentro e fora do Brasil. Depois que o Fábio e o Bá ganharam o (s) Eisner (s!), o Grampá e o Rafa Coutinho fazendo álbuns muito bacanas, o Kako sendo convidado para exposições no mundo inteiro, o Jeff Costa tendo acabado de adaptar Kiss me Judas em um livro de mais de 300 páginas... e eu e o Bruno D'Angelo lançando um álbum bilíngüe que será lançado também no Japão, bem... por aí dá pra ter uma idéia do que está acontecendo.

Oingo Boingo- Weird Science (Leonardo Martinelli e Raphael Salimena)

A Mojo funciona em (quase) todos os aspectos como uma editora convencional. É do interesse dos editores fazerem da Mojo comercial?

Sem querer parecer tendencioso, mas a Mojo Books talvez seja uma das editoras mais comerciais que se tem notícia. Infelizmente, para o grande público, um Franz Kafka, um Érico Veríssimo ou um Hemingway não vendem tanto quanto uma Bruna Surfistinha ou um Paulo Coelho. Sendo assim, como trabalhamos aliados à música, nossa penetração entre o público de todas as idades é muito mais fácil. Temos o público jovem, da música eletrônica, os indies, amantes do jazz e assim vai. Todo mundo ouve música e todos ficam curiosos em saber o que diz o livro de sua banda preferida. Obviamente que temos também outro ponto importante além da música; somos digitais, o que nos dá uma vantagem em comparação com as editoras convencionais. Por exemplo, em espaços de mídia e formatos. Um livro na Internet pode ser apenas uma reprodução digital de um livro, mas também pode ser feito de muitas outras maneiras diferentes. Este é um outro presente que estamos preparando para 2009. Assim, comercialmente falando, a Mojo Books tem um potencial imenso. Estamos fazendo ações para marcas que querem presentear seus clientes com produtos de qualidade. Um banco encomendou uma coleção de Mojos de jazz para o final do ano, uma operadora de celulares terá um portal educacional baseado no modelo da Mojo. As possibilidades são muitas, incluindo leis de incentivo à cultura e anúncios especiais para cada livro.

Como funciona a questão dos direitos autorais, com relação às bandas? E com os autores?

Das bandas, usamos apenas o nome do disco como título do livro. Todo o texto deve ser baseado numa obra e não citá-la literalmente em nenhum momento. Citações de letras sem que haja um contexto interessante também são vetadas. Temos ótimas relações com as gravadoras, que nos apóiam e sabem que a Mojo Books é um vetor de engajamento de fãs e incentivo a compra de música. Quanto aos autores, trabalhamos sempre com contratos assinados de cessão de direitos por tempo limitado. Ou seja, a Mojo guarda para si os direitos sobre a obra, mas deve ao autor um ajuste monetário de acordo com vendas. É exatamente igual ao modelo em vigor nas editoras convencionais. Como sempre digo, a única diferença é que nossos livros são feitos de pixels e não de papel.

 O Rappa - Rodo Cotidiano (Ramon Cavalcanti)

Os lançamentos bimestrais do Mojo Comix são muito tempo, não?

A periodicidade, estipulamos dois meses de intervalo por não sabermos qual seria a resposta do público e dos autores em enviar material. Agora que já estamos com um volume bacana de propostas e HQs em produção, vamos rever esse assunto e talvez lançar mensalmente. Tudo depende da quantidade e qualidade do material que recebermos.

Como alguém deve fazer para ter seu material avaliado pelos editores da Mojo? Há critérios os quais o escritor/desenhista deve levar em conta?

Sim, claro. No site temos uma seção chamada Envie seu livro. Ali estão todas as informações e regrinhas básicas. Para os Comix o processo é um pouco diferente para que o autor não perca tempo produzindo todo o material e correr o risco de ser vetado depois. Por isso, acompanhamos o processo desde o roteiro até o envio. Na Mojo só publicamos material original - por enquanto. Como o formato dos Comix é diferente (quadrado, 12 x 12 cm) e algo entre 10 e 16 páginas - com exceções - a história tem de ser pensada para esse formato. Um dos pilares da Mojo é produzir material específico para a web. Simplesmente adaptar um quadrinho feito para formato americano, com quilos de texto, pode não dar certo.

Na Mojo, todo material publicado pode ser esgotado, por haver uma tiragem/downloads máximo. A editora já republicou algum?

Sim, estipulamos um número de 'tiragem' para cada Mojo que depende da fama do autor, da fama da banda, etc. Acho que já são cerca de 10 Mojos esgotados, mas fazemos isso para que nossos leitores interajam - uma coisa bacana que a Internet permite. Claro que não esgotamos achando que as pessoas não vão enviar os PDFs por e-mail para os amigos. Nós queremos realmente que os leitores troquem seus MOJOs por e-mail! Se alguém quiser um Mojo esgotado, uma saída fácil é entrar na comunidade da Mojo Books no Orkut onde o pessoal envia os Mojos esgotados para você.

E a Bienal do Livro, como foi a participação da editora no evento, já que ela é uma editora 100% digital?

A Mojo está em todos os lugares, não somente na Bienal. E por sermos digitais, não precisamos de espaço físico. Imagine chegar na Bienal e receber um aviso para ativar o Bluetooth do seu celular caso queira receber e-books de graça. Esse é o tipo ação que a Mojo faz. Sem derrubar árvores, sem aumentar a assinatura de carbono e manter este planeta tão saudável quanto possível.

Nirvana - In Utero (Base-V )

O que muda com a nova parceria entre a Mojo e o coletivo/estúdio BASE-V?

A Base-V é um coletivo talentosíssimo que produziu um lote de capas para a Mojo Books. Na verdade, em essência, não mudou muito, exceto pela nova linguagem das capas. Mas essas primeiras dez capas produzidas são apenas para mostrar outras possibilidades de arte. A Base deve fazer simplesmente um trabalho de direção de arte e outros artistas continuarão sendo convidados normalmente para ilustrarem as capas. O que vai mudar muito o visual da Mojo em 2009 será a abertura para envio de capas por parte dos usuários. Já que somos uma editora 2.0 e recebemos propostas de textos, porque também não de artes?

Saindo um pouco do mundo Mojo, você como Ricardo Giassetti, o que anda produzindo?

Minha vida profissional está quase toda tomada pela Mojo agora. Me desliguei da agência onde trabalhava - prestava serviços de redação e planejamento para a Tribal e outras agências como a Thompson - em junho para cuidar somente da Mojo. Projetos off-Mojo: acabei de lançar o livro em Quadrinhos O catador de batatas e o filho da costureira na Bienal do Livro. Estou traduzindo uma coleção juvenil para a Editora Aleph com lançamento previsto para outubro próximo, um clássico da literatura ainda inédito em português. Em quadrinhos, estou escrevendo dois livros novos. Um é a biografia de uma pessoa que mudou o mundo em que vivemos e pouca gente sabe disso; o outro é uma história de ficção. Quando canso de um, relaxo escrevendo o outro.

Recentemente traduziu para a Editora Pixel Os Invisíveis; fale um pouco a respeito do processo de tradução de um álbum em quadrinho...

Traduzir Os Invisíveis, como eu disse ao Cassius Medauar (editor), é ao mesmo tempo êxtase e martírio. Mas eu nunca poderia me negar a fazer esse trabalho. Desde quando a Pixel pegou a Vertigo o André Forastieri já havia me avisado que eu seria o 'felizardo'. O conceito e o texto do Grant Morrison em Os Invisíveis é um dos mais difíceis que já li ou traduzi, com referências que vão de tecnologias estranhas a textos clássicos de gente como Lord Byron e Percy Shelley. Espero que a série continue, porque sinceramente sou fã do Morrison, além de praticamente igual fisicamente. Uma vez nos cruzamos na San Diego Comic Con e aquilo pareceu uma cena de filme do David Lynch: a mesma pessoa se vendo em um lugar público. Sinistro!

O que acha do cenário nacional de Quadrinhos?

Acho que está cada vez melhor. Como citei a turma do Bang Bang anteriormente, há ainda um monte de gente fazendo coisas incríveis. Tem os caras da Desiderata, tem editoras publicando álbuns como A Relíquia, do Marcatti, tem grupos que se formam como o pessoal do Tarja Preta e tantos outros. Uma coisa muito bacana que está rolando é a iniciativa do Cadu Simões no 4º Mundo, para que o pessoal dos fanzines movimentem suas revistas pelo Brasil inteiro e assim conseguem produzir mais e mais.

Quais as principais diferenças editoriais que percebe com relação à época da Pandora Books e hoje? Se tratando de material importado.

Minha idéia com a Pandora nunca foi lançar Quadrinhos em banca de jornal. Na época (1999) eu já via o mercado de livrarias como um oásis para as HQs, mas os meus parceiros queriam continuar no século XX. Quadrinhos menos comerciais em banca estão fadados ao fracasso - mesmo em se tratando de Sin City ou a Liga Extraordinária - e assim a Pandora foi tendo mais derrotas que vitórias no decorrer do processo, por isso saí a tempo de não me envolver com atitudes menos honestas. Hoje, editoras que investiram em livrarias, como Conrad e Devir, têm um volume de lançamentos e vendas bastante sólido, um ambiente no qual a Pandora poderia despontar como marca de sucesso atualmente. Basta observar os títulos que publicávamos, como Dredd ou Slaine. Será muito simples de enxergar essas obras em formato encadernado, esgotando sua tiragem de 3 mil cópias a 50 reais em dois anos ao invés de vendas de 1,5 mil a 7 reais em um mês e um encalhe de 8,5 mil exemplares. A matemática é uma matéria muito simples.

Quais as possibilidades, que vê hoje, para o quadrinhista brasileiro que está fora das grandes editoras?

Há muitas. Nem sempre uma editora grande é o melhor caminho. O importante é produzir sempre. Produzir é o único modo de aprimorar seu trabalho. Depois de praticar, você poderá escolher onde quer publicar sem muita preocupação. Muita gente acha que já deve ir diretamente para as grandes, o que é um erro. Enquanto você não tiver um volume consistente de trabalho, ninguém acreditará que você é um profissional capaz de cumprir prazos com qualidade. No caso do Catador de batatas, eu e Bruno pudemos escolher entre quatro ou cinco editoras. Tanto porque somos conhecidos, mas também porque o material já estava bastante adiantado. Assim, escolhemos a JBC porque foi a única que nos possibilitaria uma versão em japonês e um lançamento do livro no Japão nos próximos meses.

Caso queira acrescentar algo, fique à vontade.

Ops, já falei demais! Obrigado pela entrevista e um grande abraço aos leitores do Bigorna e em especial ao Eloyr Pacheco, um dos melhores chefes que tive na minha vida.

O Bigorna.net agradece a Ricardo Giassetti pela entrevista, concedida em 21/08/2008

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