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Entrevista: Edra
Por Eloyr Pacheco
14/12/2007

O cartunista Edra mora em Caratinga, a mesma cidade em que nasceu Ziraldo, e onde ele organiza um Salão de Humor que é uma referência na área. O cartunista também organizou a coletânea Ninguém Segura Caratinga e não pára de produzir. Esta entrevista demorou um pouco para ser concluída porque o pegou em meio a organização do Salão de Humor de Caratinga deste ano. Aqui, entre outros assuntos, Edra comenta sobre seu trabalho, sobre o concorrido Salão e seus livros, sempre lançados de forma independente.

Como é fazer cartum para jornal? Pelo que os cartunistas comentam comigo é realmente difícil manter a inspiração apesar do farto material oferecido pelos políticos! (risos)

Por incrível que pareça, é exatamente o farto material que os políticos nos oferecem de bandeja (geralmente abarrotadas de pizzas) é que hoje me tira o estímulo de produzir charges. Além do mais, certos assuntos se estendem de tal forma que fica repetitivo e o chargista acaba esgotando sua criatividade em cima de um mesmo tema tentando extrair dentro daquele enfoque o maior número de charges possível e assim se alastra em todos os jornais (o desastre da TAM, o caso Renan...). O leitor pode ficar uma semana sem acompanhar as charges nos jornais que vai ver de novo um desenho de um aviãozinho caindo, a oposição tentando tirar o Renan da sua cadeira de presidente do Senado, um saco!! Aí perde-se a graça, fica banal... Angeli, no meu ponto de vista, mantém a sua genialidade, dando interpretações com uma nova proposta, fugindo do padrão quando canaliza a crítica e o humor em cima do cidadão comum e sua natural conseqüência. Você percebe a sacada de uma forma mais incisiva, irreverente. Jean e Leonardo, com estilos distintos, também me agradam. Comecei fazendo charge num dos maiores jornais do país, o Correio Braziliense, em 1980 (peguei ainda o ranço da ditatura, Geisel, Figueredo, Delfim Neto, Inflação braba...). Atualmente, faço charges há cinco anos num jornal diário da minha cidade, e o que me move é o desafio de fazer charges em cima de acontecimentos ocorridos em nossa comunidade e região, do nosso prefeito, dos vereadores, do nosso trânsito, a falta de estacionamento, do esgoto a céu aberto, enfim, da realidade que vivemos aqui.. E isto é um diferencial pra mim, para os leitores do jornal e da nossa gente. Se fosse pra fazer charge abordando o mesmo que os grandes jornais dos grandes centros, eu não toparia. Particularmente gosto mais de criar cartum, embora não exista mercado editorial pra isso, mas aí é outra história...

Quer comentar esta “outra história”?!

É no cartum que sinto a magnitude do artista, seu poder de criação, de síntese. O aspecto da linguagem universal, da amplitude de temas e mensagens me fascinam. No entanto não há mercado para publicação de cartum. Me parece que o Jaguar tem planos neste sentido na Editora Desiderata, não é mesmo?

Todos os seus livros foram editados de forma independente?

Sim. Nunca tentei uma editora. Achei mais fácil montar uma gráfica (risos). Junto o material, edito, corro atrás de patrocínio, promovo o lançamento, depois coloco os livros que restaram debaixo do braço, ponho o pé na estrada e ofereço aos amigos e assim concretizo meu sonho e as edições se esgotam. Detalhe. Todos os meus lançamentos são muito prestigiados, não somente na minha pequena Caratinga. Meu primeiro livro que lancei, o Chulé, foi em Brasília. A imprensa divulgou legal, os amigos prestigiaram e o público encheu a livraria. Depois esgotou nas bancas. Estrela!!!! Graças a Deus!!!

Sabe que eu também acho mais fácil montar uma gráfica?! (risos) Mas, nada como a liberdade editorial, não acha?

Não há dúvida. Disse isso tirando um sarro. Incondicionalmente pensei em montar uma gráfica, mas sem esta intenção de impor trabalhos meus no mercado. Foi uma ordem natural. Fora de Caratinga, só morei em Brasília, e lá não existe nenhuma iniciativa desta natureza. Voltei pra minha cidade pensando em me estabelecer no mercado gráfico. Atualmente não tenho mais gráfica. Comecei com uma máquina de mesa e cheguei até a uma de formato dois, rodando livros, revistas, jornais com policromia e tudo mais. Mas, tudo foi embora com as duas enchentes que assolaram nossa cidade nos anos de 2002 e 2003. Eu ainda consigo brincar diante desta situação dizendo que sofri a operação prestobarba: a primeira foi tchum!!! E a segunda tcham tcham tcham!!! (risos). Nunca tentei emplacar nada em editora, sem traumas...

Que coisa, hein?! (sem mais comentários) Ninguém Segura Caratinga! é o seu livro que está tendo o maior destaque, não é? Eu mesmo vi o Ziraldo o mostrando em mais de um programa! Ele ama sua cidade natal e quando mostra o livro parece fazer com muito orgulho...

Sem dúvida Ziraldo deu a este livro uma visibilidade maior. Empolgou com a proposta e delirou com o título que extraí em cima de uma frase inserida num texto dele publicado no Pasquim, declarando o ufanismo de todos nós caratinguenses (risos). Falou do livro no programa do Jô Soares, Leda Nagli e Amaury Jr. Três programas de grande audiência e despertou interesse das principais livrarias do país. Mas, como citei acima, todos os meus livros publicados atingiram o retorno favorável e tem aqueles que considero ter valor histórico e um grau de importância no mercado deste segmento. Uma “dose” de Humor Mineiro traz trabalhos de grandes nomes do humor gráfico de Minas Gerias e Humor Cerrado, que registra uma coletânea dos cartunistas pioneiros de Brasília.

Como surgiu a idéia de idealizar o Salão de Humor de Caratinga?

Caratinga é a cidade natal de um ícone, de um cartunista que é o maior ídolo da maioria absoluta dos artistas gráficos brasileiros, que influenciou várias gerações deles e que ainda mantém em alta o seu carisma para a novíssima geração. Sendo eu também cartunista, conterrâneo e fã incondicional do Ziraldo e nutrindo um amor tão intenso quanto ao dele a Caratinga, foi quase que automático eu vislumbrar um solo fértil para realizar aqui um salão de humor. Imaginei que associar o nome do Ziraldo a Caratinga e a um Salão de Humor seria uma química perfeita para o sucesso. E hoje, graças a Deus (sempre graças a Ele) tenho a prova de que estava certo. Apesar das grandes dificuldades enfrentadas ao longo destes anos, o nosso salão entra para sua décima edição no próximo ano, desfrutando de grande prestígio no país, de credibilidade entre os artistas e vem conquistado a cada ano, mais e mais participações de cartunistas do exterior. Estamos entre os cinco salões de maior longevidade no país. Isto não é pouca coisa!

Como você vê a evolução do Salão de Humor de Caratinga que este ano teve sua  9ª edição realizada?

O salão possui um acervo fantástico de trabalhos além de muitas exposições paralelas. Nossa proposta de itinerância, inédita entre salões do Brasil, vem se ampliando gradualmente. Temos o orgulho de já possuir um leque de revelações de artistas que tem ganhado notoriedade e ou que já são consagrados hoje no país, como o cartunista Rossi que recebeu seu primeiro prêmio no nosso salão. Reconheço que precisamos melhorar o valor em dinheiro da nossa premiação, mas temos um atrativo especial que é o “Troféu Pererê”, muito cobiçado pelos artistas pela sua beleza plástica e por ter um valor histórico onde o contemplado leva pra casa uma recordação da cidade do Ziraldo. Editamos a Revista HUAI (HUmor Ano Inteiro), um informativo oficial do evento. Para o próximo ano queremos inaugurar a “Casa de Cultura Ziraldo Alves Pinto” e a Gibiteca “Turma do Pererê”.

E você faz tudo isso sozinho? Que tipo de apoio você tem recebido?

Cara, eu fico embasbacado quando visito outros salões e me deparo com o trabalho de produção executado por equipes segmentadas, com quarenta, cinqüenta, de até oitenta pessoas, sei lá. Estrutura de todas as ordens, envolvimento de entidades no processo geral e daí analisar como eu consigo fazer um salão sem a mínima comparação da mesma ordem, e ainda por cima numa cidade do interior. Aqui eu assobio e chupo cana. Do parafuso de uma tenda a passagens de avião que vai trazer os artistas convidados, tudo passa por mim, apoiado por uma reduzida equipe de abnegados amigos que ajudam voluntariamente. Mas nada interfere no resultado final da formatação do salão, na qualidade e proposta do mesmo. Não fica devendo em nada, neste ponto de vista, aos grandes salões do nosso país, e te digo mais, até as falhas são similares (risos). Estamos pecando na comunicação com os participantes, isto tem me chateado bastante. Isto ocorre quando o salão esta acontecendo e realmente fica desumano a minha tentativa de superação. Agora chega, isto vai ser definitivamente solucionado daqui pra frente. Devo lembrar que a população de Caratinga, faz deste evento um sucesso total. A visitação é muito grande, os empresários uniformizam seus funcionários com camisetas com a logo do salão, em todos os locais há comentários e a cidade vive realmente um clima, uma aura de alegria e humor.

Fale um pouco mais sobre a Casa de Cultura Ziraldo Alves Pinto e a Gibiteca Turma do Pererê. O que você está planejando e como viabilizará estes projetos tão importantes?

Pra variar não vai ser nada fácil, mas tenho muita fé em Deus que vou conseguir mais esta conquista. A “Casa de Cultura Ziraldo Alves Pinto” vai ser um espaço em Caratinga para expor tudo que se refere ao filho mais ilustre da cidade. Nela também ficarão expostos os trabalhos vencedores e serão arquivados todos os desenhos do acervo do nosso salão, além da gibiteca “Turma do Pererê”. Ao longo do ano serão promovidas oficinas de desenho, música, teatro, e outras atividades como o clube de leitura. A proposta é de associar de forma incisiva o nome de Caratinga ao Ziraldo e Menino Maluquinho, numa forma de homenagear e demonstrar nosso reconhecimento e admiração ao nosso ídolo maior perpetuando sua extensa e importante obra em sua terra natal e ao mesmo tempo oferecendo um espaço as crianças para desenvolverem suas aptidões artísticas e adquirir o hábito da leitura. Para viabilizá-la tenho o aval do Ziraldo. Ele entra com o nome e com a força deste nome vou buscar mecanismo e parcerias para buscar recursos.

Obrigado, Edra, pela entrevista. Estou muito feliz em ter conhecido um batalhador como você. Parabéns pelo trabalho que vem realizando.

Estive conversando com Gual*, um amigo que respeito, admiro muito e que é uma referência não só em salões de humor como em tudo que se trata de humor gráfico nacional, da minha necessidade de externar esta batalha pessoal que venho travando. Com nove salões de âmbito internacional realizados na bagagem e a organização de três livros aglutinando importantes artistas nacionais, suplantando obstáculos e mais obstáculos, credenciam minha capacidade de realizador. Sou realmente um batalhador, pra mim não há uma denominação mais justa. Sinto-me também feliz e agradecido por me concederem este espaço para estas declarações.

*Gualberto Costa também é um dos organizadores do HQ Mix e um dos donos da HQMIX Livraria.

O Bigorna.net agradece a Edra pela entrevista concedida por e-mail e finalizada em 06/12/2007.

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