Os Guerreiros da Tempestade estão se destacando, não apenas nas bancas de revistas, mas no mercado de licenciamento. O leitor habitual do Bigorna.net tem acompanhado a trajetória da produção destas revistas, que mudaram de formato para agradar os leitores, ampliaram a distribuição (de regionalizada para nacional) e agora os personagens estrearão um longa-metragem em animação. O Bigorna.net entrevistou os dois responsáveis por este trabalho, que, para assombro de muitos, não está baseado no eixo Rio-São Paulo. A editora tem sede em Goiânia, Goiás. Neste bate-papo por e-mail exploramos como a dupla (de abnegados) se formou, quais os gostos de cada um e como surgiu a possibilidade do filme. Muitas outras perguntas ficam para ganharem respostas em um outra oportunidade. Com vocês: Anísio Serrazul e Fábio Azevedo!

Anísio, como começou o seu interesse por Quadrinhos? E como surgiu a série Guerreiros da Tempestade?
 
O fascínio pelos Quadrinhos começou muito cedo. Tinha seis anos e morava na periferia de Goiânia, a rua não era asfaltada e ainda não havia banca de jornal nos arredores do bairro. Acredito que, por esse motivo, o meu primeiro contato com o mundo dos super-heróis foi algo mágico. Eu tinha um amigo da minha idade na sala de aula que estava sempre carregando cadernos com desenho para cima e para baixo e aquilo me chamou a atenção. Um dia, me aproximei e vi o que ele desenhava em uma folha fina sobre uma página de gibi, era o Poderoso Thor segurando o martelo Mjolnir. Cara, aquilo me saltou aos olhos e despertou uma fome por Histórias em Quadrinhos que até hoje não saciei.

Desenhei Turma da Mônica, Popeye, Tio Patinhas, Pica-Pau, Pantera Cor-de-rosa, Fred Flintstone, Speed Racer, Zé Colméia, a Turma do Professor Pirajá, do Daniel Azulay, e uma legião de personagens que faziam sucesso na minha infância. Mas tudo isso não me atraía como os super-heróis, e foi aí que comecei a criar. Lembro que em 1982, quando iniciei a carreira como chargista no maior jornal diário de Goiás, percebi que devia gerar personagens que transmitissem nacionalidade e aproximassem o leitor do nosso cotidiano. Em 1984, quando servia o Exército em Brasília, tive a oportunidade de publicar em um jornal dos Dragões da Independência o meu primeiro super-herói, o “Super Dragão”, personagem tirado da mitologia dos Dragões da Independência, isso me mostrou o quanto os leitores se sentiam bem com algo que lhes era familiar.

Os Guerreiros surgiram em meados de 1999, em minha mente, e em pouco tempo foram tomando conta do meu dia-a-dia por meio de esboços e muita pesquisa, até que em 2005, aos trinta e nove anos, realizei o sonho que me perseguia desde a infância. De lá para cá, tive muitos erros e acertos, com as críticas aprendi a melhorar com humildade, quanto aos acertos eles estão aí e ninguém pode negar, mas ainda tenho muito o que aprender, e é isso que me estimula. A participação e o apoio de vocês, da mídia especializada, foi, é e sempre será muito importante.
 
Fábio, como iniciou a parceria para publicação de Guerreiros da Tempestade pela ND Comics?
 
Tudo começou em 2005, durante o lançamento dos Guerreiros em um shopping de Goiânia. Naquela época eu ainda estava como minha empresa de consultoria nas áreas de franquias e shopping centers, nunca poderia imaginar que um dia faria parte de um projeto como este. Sempre fui apaixonado pelo universo dos Quadrinhos, mas naquele momento minha vida estava em outra direção, com uma rotina executiva, envolvido em outra esfera do mercado. Nas horas vagas, em casa, me dedicava a alguns projetos de livros que escrevia nas áreas de negócios, motivação e também romance de ficção. Quando conheci o Anísio minha identificação foi imediata, começamos a conversar e percebi que além de fortíssima veia autoral ele possuía grande visão comercial, passamos a planejar e ativar algumas idéias e a sociedade se firmou e parei com as atividades que exercia, pois estava humanamente impossível conciliar as duas.

Fui criticado, tachado de maluco pelos “amigos” que diziam que tudo era coisa de criança, como que eu poderia largar o que estava fazendo para “mexer” com gibi? Mas o sonho de infância ainda persistia em minha mente, poder construir a vida trabalhando com Quadrinhos era realmente algo muito sedutor, então resolvi encarar! Segui minhas intuições e mergulhei de cabeça no projeto Guerreiros da Tempestade e, graças a Deus, hoje consegui unir o sonho ao trabalho. Não tem sido fácil, a ralação é pesada como em qualquer outro mercado de trabalho. O setor editorial é uma roda-viva, principalmente este no qual trabalhamos, mas estamos aí, fazendo! E para os que me criticaram naquela época, o sonho e os negócios vão bem, aliás, muito bem, obrigado!

Como você vê, Anísio, o mercado para o Quadrinho Nacional atualmente?
 
Vemos o mercado sempre com muito otimismo. Hoje, posso responder essa pergunta com muita propriedade, pois sei que publicar Quadrinhos nacionais no Brasil não é fácil, construir Brasília também não foi! A primeira barreira a ser vencida é o preconceito, digo isso porque não adianta desenhar, escrever, imprimir e distribuir se não há interesse por parte dos leitores. Nos blogs, por exemplo, muita gente detona esse ou aquele autor sem sequer ter lido ou folheado uma revista sua na banca, age assim simplesmente por preconceito e ignorância. É claro que há inúmeras dificuldades para quem se aventura no ramo, mas posso afirmar que existe espaço para todos que tenham perseverança e visão comercial.

Estamos presenciando um grande momento das HQs nacionais e devemos procurar a união de todos que amam a Nona Arte em torno desse grande ideal, pois não adianta pensar que de uma hora para outra a situação mudará. É preciso que saibamos construir um mercado e depois sustentá-lo com seriedade. Ainda lembro como se fosse hoje, quando ia a uma banca e me deparava com um lançamento da Ebal ou RGE, as revistas duravam algumas edições e depois sumiam por anos, mas os estrangeiros continuaram acreditando e dominaram o mercado e, hoje, quando alguém tem muito talento vai desenhar para editoras de fora. Acredito, sim, no mercado para Quadrinhos nacionais, pois temos grandes batalhadores espalhados pelo País apresentando seus personagens em bancas, fanzines ou Internet. No nosso caso, as dificuldades são o combustível que nos impulsiona.
 
Quais seus Quadrinhos preferidos? Primeiro o Fábio.
 
Bem, vamos lá! Essa é a melhor parte da entrevista! Cresci lendo Disney, Mickey e Pateta, eram meus preferidos. Com o passar do tempo fui enveredando pelo mundo dos comics, ainda na época da saudosa RGE. Comecei lendo de tudo, mas aos poucos me identifiquei com o nosso amigo Stan Lee e seus parceiros, Jack Kirby e Steve Ditko, mergulhei de cabeça no mundo de Homem-Aranha, X-Men e Quarteto Fantástico. Aos poucos fui descobrindo outros universos no mundo da Nona Arte, me fascinando por roteiros como os de Alan Moore, Frank Miller e Will Eisner, este último sempre me surpreendeu em todos os sentidos, desde o roteiro até a arte-final, com uma riqueza de detalhes fantástica.

Falando de quadrinização, Kirby e Eisner são na minha opinião realmente imbatíveis, sem esquecer do grande mestre Joe Kubert que também admiro muito, com seu eterno Tarzan.
 
E os seus, Anísio?

Curto de tudo, mas hoje coleciono trabalhos dos meus colegas brasileiros. Tenho quadrinhos do Cedraz (Turma do Xaxado), Altemar Domingos (Jaguara), Francenildo Sena, Rodrigo Garrit, Milton Estevam, Mark Novoselic, Leonardo Santana, Wendel, Carlos Alberto (Brado Retumbante), Samicler (Cometa), Lorde Lobo (Topman e Penitente), Milé e Pinheirinho (HQ Bíblica), Christie (Cabeça Oca), Adauto Silva, Arthur Filho, Bruno Santos, Carlos Henry & Márcio Sennes, Sandro Marcelo e Shimamoto (Billy the kid & outras histórias), Jorge Braga (Romãozinho), Emir Ribeiro (Velta), Gabriel Rocha (Lagarto Negro)... ufa! Tá vendo como isso só pode é dar certo!
 
Como foi, Fábio, que surgiu a possibilidade do filme de Guerreiros da Tempestade?
 
Entre nós já pensávamos em cinema, mas o plano de negócios era para cinco anos após o lançamento da HQ. Tudo aconteceu muito rápido, e com um ano e meio veio o convite, mais exatamente em São Paulo, na feira de negócios Brazil Promotion 2006, maior evento da América Latina no segmento promocional. Foi realmente um ano de surpresas, nosso estande na feira foi o mais visitado no setor de licenciamentos e personagens, durante o evento fomos consagrados pela Abral - Associação Brasileira de Licenciamento, como a primeira licença de super-heróis do País. Para nós isso já era muito para uma estréia, mas dois meses depois, a organização do evento nos informou que concorreríamos ao Prêmio Brazil Promotion Idea 2006 na categoria licenciamento de marcas, personagens e celebridades, um dos mais importantes no mundo no setor. Ficamos surpresos, pois lá estavam empresas como Globo Marcas, Universal Pictures, Warner, ITC América (representante da Marvel para a América Latina), entre outras.

Era um evento grandioso e não queríamos acalentar esperanças, estreávamos em um mercado severamente competitivo e arrojado, mas felizmente, mais uma vez fomos surpreendidos, conquistamos o 1º lugar com Guerreiros da Tempestade e o 3º lugar na mesma categoria com Raio e os Jovens Guerreiros da Tempestade. A feira catapultou os personagens definitivamente para o mundo dos negócios do setor de entretenimento.

O produtor carioca Diler Trindade ficou fascinado com os Guerreiros e nos convidou para iniciar a produção do longa animado. Seria o primeiro longa-metragem de super-heróis do País, mas não nos intimidamos e topamos de imediato. De lá para cá, a correria tem sido absurda! Estamos numa verdadeira briga alucinada contra o tempo, mas o que nos deixa tranqüilos é a competência de todos os envolvidos, desde a copeira que nos serve o cafezinho na editora até os profissionais responsáveis pelos mínimos detalhes da produção no pólo cinematográfico do Rio de Janeiro.

O Bigorna.net agradece a Anísio Serrazul e Fábio Azevedo pela entrevista.

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