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Resenha: La Table de Vénus
Por Marko Ajdarić
16/11/2005

Desde 2004 nós procuramos noticiar o que o brasileiro José Roosevelt vem realizando como quadrinhista (e também como pintor) no mundo das bandes dessinées. Agora, com a chegada a nossas mãos de La Table de Vénus, publicada pela Editions Paquet, podemos dizer - nesta que é a primeira resenha em língua portuguesa de uma obra sua - que valeu muito a pena: os brasileiros podem se orgulhar de mais este representante no âmbito de um dos mercados mais exigentes do mundo.

Com La Table de Vénus, cuja última edição se deu em 2004, pela La Boîte à Bulles, de Paris, Roosevelt nos oferece uma aula do quadrinho como forma-romance, com um exemplar uso de várias possibilidades da Nona Arte, num álbum de mais de 170 páginas em preto e branco e formato grande. José Roosevelt poderia ter sido um excelente cineasta, mas, para nossa sorte, ele desenha (e pinta) muito bem, o que com o tempo e o exercício, resultou num sólido domínio dos enquadramentos, do uso do branco (fundamental em uma HQ em P&B) e por meio da criação de personagens que são rápida e duradouramente assimilados pelo leitor. Os planos usados para mostrar a sociedade pós-moderna na qual ninguém trabalha e - como está descrito em um quadro síntese - "a sociedade sempre soterra o indivíduo são de uma calma eloqüência: apesar da riqueza de detalhes, nada sobra neles". Do ponta de vista do roteiro, La Table de Vénus é uma maravilhosa composição de personagens e - principalmente - de situações.

Tendo como pano de fundo um mundo em que até o sexo real foi banido e até a televisão depende da boa vontade e de algumas doses de golpes de poder para voltar a estar na ordem do dia dos cidadãos, várias tramas se delineiam com muita clareza (com exceção de um personagem cuja ação se dá por meio de um monólogo ao telefone, único senão do álbum ao nosso ver, por acrescentar muito pouco), e o profundo conhecimento de Roosevelt de temas ligados à religião, à mitologia e a astrologia permite criar situações absolutamente verossímeis e que criam empatia no leitor, especialmente pela forma como ele trata a recomposição - através de fragmentos escritos - da mensagem e do exemplo de Jesus Cristo por parte de Juanalberto (meio-homem, meio pato), e sua turma de amigos.

Sem resvalar para o simplismo, Roosevelt consegue criar personagens que nos acompanharão por muito tempo, em suas situações de amor, sexo virtual, mera bobeira pós-moderna, encantamento com a leitura (que tinha sido banida da vida legal) e algumas traições. Especialmente por sua enorme capacidade de nos tirar do eixo de nossas certezas, com inúmeros detalhes de escritura que - como nos melhores romances - aparecem aos poucos depois de leituras sucessivas. E de mais a mais, trata-se de uma excelente obra de quadrinhos, que foi pensada e bem executada para explorar bem as possibilidades dos quadrinhos, em cada momento, até a ótima sacada da carta em que o personagem central diz por que escolheu a forma quadrinhos para "contar suas histórias". Não é toa que as resenhas de lá sempre colocaram a obra do brasileiro como "inclassificável".

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